O futebol feminino do Brasil, enfim, está nas mãos das mulheres. Inicialmente, a afirmação pode parecer simples ou até óbvia, mas não era o que acontecia até pouco tempo atrás. Historicamente, o futebol feminino no País foi chefiado por homens e isso começou a mudar no ano passado, com a contratação da técnica Pia Sundhage para a seleção brasileira principal e a chegada de Aline Pellegrino como coordenadora de competições femininas da CBF e ainda Duda Luizelli na coordenação de seleções femininas da entidade em setembro deste ano. É um passo gigantesco para a CBF.
Desde que Rogério Caboclo assumiu o comando da entidade, em abril de 2019, ele sofreu pressão para mudar a visão de como tratar o futebol feminino no Brasil. Mesmo assim, bancou Oswaldo Alvarez no comando do time nacional e colocou Marco Aurélio Cunha na função de coordenador das seleções. Os resultados foram ruins e isso abriu espaço para as mulheres, que já pediam passagem.
Além de Aline e Duda, a seleção tem outras mulheres na linha de frente. Os homens viraram minoria. Na seleção principal, Pia Sundhage é a técnica e tem como auxiliares Lilie Persson e Bia Vaz. Na seleção sub-20, Jéssica de Lima é assistente do treinador Jonas Urias. No time sub-17, a treinadora é Simone Jatobá, com o auxílio de Lindsay Camila e da preparadora de goleiras, Marlisa Wahlbrink.
“O importante é cada vez mais termos mulheres capacitadas. Cada vez mais os clubes estão buscando mulheres para posições de comando na gestão e parte técnica. Já estamos programando cursos de capacitação para gestoras, para técnicas, para quem trabalha com o futebol feminino”, disse Duda, em entrevista ao site da CBF.
Aline e Duda chegaram à seleção no começo do mês e ainda estão na fase de estudos da situação. Mas suas experiências como dirigentes da Federação Paulista e do Internacional, time de Porto Alegre, respectivamente, facilitam na adaptação.
“Elas viveram o que a gente vive e passaram até por momentos mais difíceis. Elas sabem do que a gente precisa e qual a nossa briga diária. É diferente ter alguém no cargo que entenda das coisas”, disse Camilinha, meia da seleção brasileira e do Palmeiras, em entrevista ao Estadão.
A diferença financeira, porém, ainda é um tabu, mas melhorou consideravelmente. A CBF decidiu igualar os valores de premiação e diárias entre as seleções masculinas e femininas. Na Olimpíada, ambos ganharão o mesmo valor. Na Copa, a quantia será proporcionalmente ao que a Fifa oferece.
A expectativa, agora, é que todas essas mudanças se tornem vitórias e títulos para o futebol feminino do Brasil, de modo a continuar despertando o interesse da garotada. “A ideia é avançar. Esse é mais um passo que estamos dando. Já fizemos bastante coisa, estamos fazendo mais e temos ainda mais coisas para construir juntos”, disse Aline em coletiva de apresentação.
“A Aline e a Duda representam a vitória da classe das atletas que estudaram e se esforçaram. Significa o reconhecimento do que elas foram como atletas e do que fizeram como gestoras. Agora elas têm a chance de aplicar algo que talvez só quem tenha sido atleta consiga, esse sentimento do que precisamos para crescer”, comentou a lateral-esquerda Rosana, do Palmeiras e da seleção, ao jornal Estadão.
Quem são as mulheres que comandam o futebol
Hoje, o futebol feminino no Brasil está nas mãos de três mulheres: Aline Pellegrino, Duda Luizelli e Pia Sundhage. As três são as responsáveis por reerguer a seleção brasileira e colocá-la novamente entre as melhores do mundo. O currículo do trio mostra que elas não estão em seus respectivos cargos por acaso.
Aline trabalhou como diretora de futebol feminino na Federação Paulista de Futebol (FPF) desde 2016 e sempre foi citada como uma das melhores na função. Sua experiência se dá fora e dentro de campo. Ela foi capitã e medalhista de prata na Olimpíada de Atenas, em 2004, e ouro no Pan-Americano de 2007, no Rio. No total, foram nove anos defendendo a seleção e com passagens vitoriosas em diversos clubes. No Santos, conquistou duas Libertadores da América.
Duda também teve sucesso na seleção antes de virar dirigente. Ela conquistou o bicampeonato Sul-Americano, dentre outros feitos, em seus oito anos vestindo a camisa verde e amarela. Na década de 1990, foi uma das primeiras brasileiras a atuar no exterior. Jogou no Milan e no Verona, ambos da Itália. Em 2016 assumiu o cargo de gerente de futebol no Inter, onde fez uma grande reformulação na categoria do clube.
“São 30 anos dentro do futebol feminino, muitos dos quais jogando e também já na parte de gestão. Temos o sentimento de saber quando a atleta está com algum problema, quando a comissão não está se sentindo à vontade em alguma situação. Faz a diferença também essa percepção que temos de ex-atleta e gestora, de alguém extremamente competitiva”, diz Duda.
Pia é uma referência mundial como técnica. Ela conquistou duas medalhas de ouro em Olimpíadas (2008 e 2012, ambos pelos Estados Unidos) e uma prata (2016, pela Suécia). Em 2012, foi eleita a melhor treinadora do ano pela Fifa. No ano passado, assumiu o comando da seleção brasileira e tem aproveitado o período sem competições de peso para avaliar as jogadoras e montar um time forte para a sequência do trabalho.